E notara , finalmente, o que aquele barulho um tanto cadenciado ao ritmo dos segundos passantes era. Descobrira não serem as batidas do seu coração um tanto lento. Mal pensara sobre apenas ser o reboar microscópico e aquoso de quaisquer das jugulares abrigadas em seu pescoço. Todavia, soubera, neste momento, pela evocação da memória recente, que até passara a vir-lhe difícil, de que, ao despertar, suas artérias estiveram funcionando mesmo ao ritmo do relógio, de certo modo podia senti-las, obviamente — fazia sentido a confusão relativa ao som. A atividade das referidas aumentara muito lentamente, o pulsar era lento; gradualmente aumentara; mas ocorrera de uma maneira estranha, quase como... Como se estivera em câmera lenta.
Olav apenas permanecera ali: contemplara a dúvida. Tentara imaginar o porquê de que sequer passara por sua cabeça mover-se dali ou assuntos e ações mais urgentes. Embora voara inúmeros pensamentos em sua mente, seu corpo apenas se deixara estar. Em verdade realizara que era um compêndio de sensações. Assustara-se, procurara-se, procurara, assustara-se novamente. Frustrara-se, revoltara-se, entristecera-se. Percebera a álgica impotência no peito. Resignara-se, a princípio, com a melancolia das perdas irreparáveis. Depois, obtivera a resignação neutra e uma paz alva onde se sucedera a mais augusta das felicidades. Acometera-lhe esta semelhante à felicidade dos pais que viram os filhos pela primeira vez na vida, bem como a de avôs que conheceram a primeira luz dos netos.
Escurecera-lhe tudo repentinamente. Mas, contrariando lógicas mundanas, a escuridão trouxera-lhe, enfim, esclarecimento. A penumbrosa imagem começara a formar-se nas retinas do aturdido homem. A definição do cenário no qual encontrara-se arrastara-se lentamente ao longo do tempo até seu objetivo; o desfecho. O indivíduo vira, contudo observara apenas o chão e a poça de sangue que se formara e, depois, aumentara. Fustigara-lhe de súbito uma dor no pescoço, na região das jugulares, que mais céleres do que d'antes pulsaram. Entretanto, para sua incauta felicidade, tão logo tudo começara a esclarecer-se, tão logo a dor pungira-lhe o organismo, terminara-se, como uma maldição mortífera. De repente não se foi mais, já não era.
Acabou.
(...)
Morre-se para o Tempo. É-se engolido e pensa-se passar a eternidade em suas entranhas. O tempo digere o não-ser e devolve-o na forma de esperanças à realidade mundana, apenas pedindo uma coisa em troca e sublinhando:
-Percorra uma história, como os olhos nas linhas da brochura. Deixe um legado. Ei-lo, cá vos tem: uma nova chance.
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